Existe um enorme potencial de ternura na cinematografia de
Agnès Varda (e.g. «Os Respigadores e
a Respigadora» 2000, «As Praias de Agnès» 2008). Esse pathos que aproxima e cativa vem de um diálogo que a
realizadora tem vindo a promover entre o tempo que se esgota sobre a
memória e a aproximação social com o trabalho e a humanidade que o pratica.
Agnès Varda tem 89 anos, tem uma longa carreira no cinema e na fotografia, vê
mal, mas não é por isso que se isola.
Pelo contrário, Agnès Varda convoca o artista plástico
JR que promove arte de rua através de enormes fotografias coladas de modo
efémero em paredes e em grandes planos públicos. JR tem 34 anos, usa sempre
chapéu, vê sempre através de óculos escuros e conduz uma carrinha-photomaton de onde saem alguns dos retratos gigantes.
Juntando dinheiro através de donativos, a realizadora e o
artista plástico resolvem praticar um acto social e expor em ponto gigante diversas
histórias encantadas, íntimas, da história social de uma França que também se
vai escoando, como o olhar desfocado de Agnès ou as horas da avó de JR, que fala pouco.
Este filme, para quem tiver a capacidade de o compreender e de
se comover, é exactamente sobre o fim do tempo. O fim do nosso tempo. Contudo,
e por paradoxo, é também sobre a alegria da criatividade libertada de escoras
ou baias. Ou seja, um filme sobre o rigor da liberdade e a arte de a lançar no futuro.
jef, fevereiro 2018
«Olhares, Lugares» (Visages, Villages) de Agnès Varda e JR. Música
de Matthieu Chedid. Documentário. França, 2017, Cores, 89 min.
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