terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Sobre o filme «Coração de Cão» de Laurie Anderson, 2015
















«Será isto uma peregrinação?»
Questiona Laurie Anderson no final. No tom pausado de quem ouve uma história para adormecer sobre a morte, fica o eco das palavras. Talvez a vida seja mesmo essa coisa estranha e abstracta, entre a alegre evocação e o sacrifício obstinado. Essa busca do prazer dentro de um percurso penoso e simbólico. Essa coisa (que os actores treinam) de nos sentirmos tristes sem estarmos tristes.
A morte da cadela ‘rat terrier’ Lolabelle, a morte da mãe, a morte de Lou Reed. Uma placa de gelo sobre o lago que se quebra e onde se afunda a cadeirinha onde empurrava os irmãos gémeos. O medo da morte, o grito no salvamento, o sorriso agradecido da mãe… A recordação transportada.
«Não se pode compreender a vida sem olhar para o passado, não se pode vivê-la sem olhar para o futuro.» A realizadora relembra Kierkegaard.
Por onde flutuaremos nós, homens e animais, quando viajamos nesses 49 dias de ‘bardo’ que se seguem à nossa morte? Estamos nós cientes de que encontraremos o erro da memória numa história que repetimos mil vezes?
Será mesmo a morte a libertação do amor?
Este é o melhor filme para compreendermos que é na estética que se condensa o lado fiel e estático, resoluto e inexorável, de uma história e de uma partida.

jef, dezembro 2017


«Coração de Cão» (Heart of a Dog) de Laurie Anderson. Com Lolabelle (rat terrier). Música de Laurie Anderson.  EUA / França, 2015, Cores, 76 min.

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