segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Do verbo Procrastinar















Jeremias não conseguia não copiar. Para ele copiar era viver porque tinha consciência de que o que mais gostava era não viver ou, pelo contrário, e que fique bem claro, tinha uma certa vocação para adiar para depois poder melhor copiar a vida. Não lhe interessava a originalidade. Interessava-lhe a perfeição. E adiar era atingi-la!

Para além de copiar, Jeremias gostava muito de coleccionar caricas e o que mais o satisfazia era seleccionar as tampinhas por estados e estilos, cores e origens. Procurava-as no chão, junto à leitaria ou à tasca do bairro. Seriava-las por refrigerante ou cerveja, pelo seu estado de conservação. Gostava de as juntar acima de tudo pelas repetições, admirava-se como elas se copiavam sem copiar. Todas iguais mas diferentes nas imperfeições.

Jeremias tinha na cave 10 estantes. Cada uma com 10 prateleiras. Cada uma com 10 caixas de sapatos, das grandes. Quase cheias de caricas diversas iguais.

Quando as caixas estivessem cheias, passaria a coleccionar as tampinhas de plástico transparente, aquelas parecidas com pequenos chapeuzinhos transparentes que selam as garrafas de 1 litro de mau vinho. Garrafas com estrelinhas pelo gargalo, cobertas no topo por alumínio colorido. Cabiam mesmo bem no interior da carica, davam-lhes estilo, ossatura, peso. E depois ainda podia ir para a rua jogar à carica. Os amigos ficariam cheios de inveja.

Ou, então, instalava na cave mais 1 estante com 10 prateleiras. Pois as 10 caixas de sapatos, das melhores, já ele as tinha guardado.


jef, agosto 2017

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