«And as your last breath
begins
You find your demons
Is your best friend.
And we all get it in the
end.»,
escreve
Scott Matthew na canção «In the End» cantada pelo carismárico Justin Bond no final
do belo e muito particular filme que John Cameron Mitchell realizou em 2006. «Shortbus». A
impossibilidade do encontro, a inconsequência da sexualidade, a insistente
busca do afecto na cidade onde toda a gente vem para ser perdoada. Nova Iorque,
após o 11 de Setembro de 2001. Ground Zero e a capacidade do amor, do erotismo
e da arte de sarar feridas e acalmar dragões, bruxas e fantasmas. Alegoria
total do Amor.
Por
alguma coincidência revi este filme um dia antes de assistir ao documentário
que Nick Willing, seu filho, realizou sobre Paula Rego. Um filme de dimensão
documental rigorosa e de um respeito afectuoso pela liberdade criativa da
pintora. Sem peias e emocionalmente vibrante. Íntimo sem ultrapassar a
privacidade. Visualmente forte, consegue não se diluir nas tintas
arrasadoras, nos brilhos cortantes, no espírito de erotismo ferido que envolve
quase todas as telas da artista. Afinal, os segredos são apenas histórias
eternas e universais. Um deslumbramento ansioso sobre uma vida que agarrou a
arte como acto único para interpretar a infância e a necessidade de levar a
família e o mundo até um futuro, por teoria, incerto. A lógica e a angústia de
alguém que parece andar sempre a pisar a fímbria do precipício, demonstrando, acima
de tudo, a importância de trazer para o colo, - lugar escondido e primordial da
libido -, todos os gatos felpudos e todos papões de dentes aguçados, em
simultâneo. Assistir a este filme (e como apetece revê-lo!) é reconciliarmo-nos
com os nossos demónios mais iniciáticos, afinal, os nossos melhores amigos..., e sem
tropeçar em demasia.
Como canta Scott Matthew.
jef,
abril 2017
«Paula
Rego, Histórias e Segredos» (Paula Rego, Secrets and Stories) de Nick Willing, Grã-Bretanha,
2017, Cores, 92 min.
Sem comentários:
Enviar um comentário