A viscosidade da lixa.
A ideia imediata que
tenho de cinema europeu de vocação «social» (preferiria escrever «socialista» mas teria de gastar muitas linhas para dizer o que não quero dizer) vai
directa aos filmes de Jean-Pierre e Luc Dardenne e ao cinema romeno. De entre
as imagens dessa Roménia dura, rigorosa, empenhada, programática, surge a
enorme força (poder) de uma actriz: Luminita Gheorghiu. Quem a vê neste filme,
nunca mais a esquece, como nunca mais a esquecemos em «A Morte do Senhor
Lazarescu» (Cristi Puiu, 2005) ou no papel minimal em «Código Desconhecido»
(2000) de Michael Haneke, outro inveterado cineasta «socialista». «Mãe e Filho»
é um filme para consagrar Luminita Gheorghiu, para lhe dar a tela toda, para
oferecer ao espectador uma personagem (Cornelia) complexa, viscosa, áspera,
quase feia, composta por camadas e silêncios, deslocando-se obstinada e
obcecada entre movimentos de câmara excessivos. Contudo, o «excesso de câmara» é
interrompido, concentrando o olhar ao espectador, nos três momentos decisivos
do filme: (a) o encontro de Cornelia com a testemunha do acidente, (b) o
momento em que a nora expõe a intimidade do seu filho; (c) o confronto final
com a perda irremediável de um filho (ou do seu amor). As três derrotas de
Cornelia. Um filme dedicado à dramaturgia da derrota que, em todo o caso, será
sempre a conquista de um certo Herói / Heroína.
jef março 2014
«Mãe e Filho» (Pozitia
copilului) de Calin Peter Netzer. Com Luminita Gheorghiu, Bogdan
Dumitrache, Natasa Raab. Roménia, 2013, Cores, 112 min.
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