O fio instável da resistência.
Se existe alguma função para um filme é fazer luz sobre o
fio, desequilibrado e fundamental, da resistência. A vida por um fio e, mesmo
assim, levá-la para a frente. O fio da ética sobre as forças cegas do trabalho
que aniquila a razão que alimenta os sentimentos que lançam o prumo da
existência. Satyajit Ray em «A Grande Cidade» (1968) colocava o poder do querer
e do sentir sobre a tirania e o desespero, sobre toda a inconsciência. Os
irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne prosseguem o corolário, demonstrando que a
carnificina colectiva só pode ser vencida pela tenacidade individual. Sandra
(Marion Cotillard) e Manu (Fabrizio Rongione) vão, durante um fim-de-semana,
desfiando de porta em porta uma litania cujo corpo está centrado no manipulador
Jean-Marc (uma personagem quase em ausência de cena, com o eterno Olivier
Gourmet a dar-lhe a fugaz presença final). «A Grande Cidade» (1968) e «Dois
Dias, Uma Noite» (2014) levam-nos à conclusão de que a História dos sem
História é feita de individual resistência. Nesse pacto de consciência reside a
estética do cinema. A sua própria resistência.
jef, novembro 2014
Sem comentários:
Enviar um comentário