A botânica do vírus ou o erro na programação.
Este é um complexo
tratado sobre a botânica dos vírus (VIH + VHC) ou um compêndio longo e
anacrónico de entomologia e do querer humano. E desengane-se quem, por pressa
mediática, vá à procura da morbidez das células ou da finitude do corpo. Aqui,
a doença é o móbil e a palavra do evangelho de João, uma espécie de lança.
Também há cães, fogos florestais, análises clínicas e, por superior humor, a
morte anunciada dos perus. Entretanto, durante a sessão, alguns filmes vão-se aproximando,
depois afastam-se. Afasta-se “Silverlake Life: The View from Here” (Peter
Friedman e Tom Joslin, 1993) pelos planos próximos com que o presente filma a
vida dos outros, incluindo a de libélulas e rãs. Aproxima-se de “Ruínas”
(Manuel Mozos, 2010) na perspectiva com que olha o presente como o grande
transfigurador de memórias. Vem à liça “Ao Correr do Tempo” (Wim Wenders,
1976), essa viagem inicial, mas sem fim, de dois homens pela fronteira de
países, entre a força dos silêncios e das palavras.
Este é um filme sobre a
esperança (ainda). A esperança de “Blade Runner” (Ridley Scott, 1982) quando,
no final, a andróide Rachael descobre que, por erro de computador, já ultrapassara
o limite vital programado, atirando para o futuro a incerteza do seu prazo de
validade. Aliás como acontece com Joaquim e Nuno. Aliás como sucede com todos
nós.
Poder-se-ia chamar o
filme de «absurdo» por observar de tão próximo a morte e o corpo só para
expressar o plano mais distante em que se movem a Vida e a Natureza. No
entanto, quando o «absurdo» toma consciência do próprio «absurdo», deixa de o
ser. Aqui, o absurdo poder-se-á apelidar de «estética do movimento e da luz».
jef, setembro 2014
«E Agora? Lembra-me» de Joaquim Pinto. Com Joaquim, Nuno, Jo, Deolinda, Cláudia, Nelson, Rita. Cores, 164 min. Portugal, 2013
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