Santo Sacrifício pelo tempo que já não existe. Vã proposta de
felicidade ausente. Vento preso no lençol do estendal. Fingida actualidade de
um corpo que muda constantemente no desejo de chegar mais perto da morte, a pedir
por um pouco mais de vida. Assim o fruto apodreceu, assim a tinta secou na caneta,
assim tão belas e heróicas odes de Píndaro desapareceram para sempre. Como se o
deixar de existir fosse o mesmo que o futuro.
Ah, Santo Ofício pela eternidade do sacrifício. Antes ele que
eu, diz o pássaro, assustado ao sobrevoar a estrada onde o ouriço-cacheiro acaba
de ser esmagado pela roda de um automóvel. Santo veículo a ultrapassar o
ofício.
Pura vantagem da ventania que abandonou o lençol
em pendente decreto da gravidade. Gravidade do ofício que é veículo do Tempo.
Um minúsculo orifício suspenso no estendal do vento cósmico. Santo Orifício!
Um orifício negro preso ao universo. Secreto. Tão negro como a
estrada. Um esférico, a outra plana, como um plano secante à esfera de raio
infinito. Pobre animal que já não olhará o pássaro do medo a correr por cima do
vento, por cima da estrada, por cima do nosso sacrifício.
Ah, Ouriço! Nosso Sagrado Bicho!
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