À
sombra do coma e do perdão
Para
nos aproximarmos do relato de Roy Andersson devemos olhar o belo cartaz do
filme. A imagem é retirada da única cena com personagens que não estão em
palco, entre o estado de coma e o estado de perdão. Dois jovens deitados na
praia acariciam-se. Suavemente. Com tempo. São acompanhados por um possível
Grand Danois, enorme e velho que, por fim, enrosca-se junto ao dono, reconciliando
o espectador com a vida.
Tudo
o resto pertence ao palco fechado e à luz feérica da ausência de fantasia. Os
movimentos são curtos, pesados, asmáticos. As caras estão pintadas. As
histórias viradas para a espera, para o perdão não retribuído, para a retirada
organizada. As cenas devolvem um humor certeiro mas que nem negro é mas
cinzento, sépia, verde-centro-de-dia. Melhor, todos os passos lentos devem à
dança. Como se os objectos coreografados por Pina Bausch ou William Forsythe estivessem
contidos num frasco de formol e colocados no corredor de um «hospital»
soviético ou no museu de história natural de algum país censurado. Como se o Jacques
Tati tivesse dedicado a sua arte não aos Tempos Modernos mas ao passado por
reflectir. Aqui as canções de guerra não sabem a que dia da semana pertencem e
os sonhos sobre o abuso da Humanidade não podem ser narrados.
Não
fosse a tal cena de uma praia guardada, salvando o futuro, toda a pantomima de Roy
Andersson deixaria de merecer o Leão de Ouro para Melhor Filme, em Veneza.
Um
filme que não servirá apenas para a reflexão estética e política dos pombos que
pelas árvores se encarrapitam.
jef,
junho 2015
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